Estava noutra noite a assistir ao programa de televisão "Bairro Alto" apresentado pelo filho desse enorme Benfiquista que foi José Fialho Gouveia e lembrei-me de ter lido há uns anos um artigo do seu filho sobre a morte do pai e o Benfiquismo que sempre partilharam.
Encontrei-o no blog "benficapower" (www.benficapower.blogs.sapo.pt) e não resisto a colocá-lo aqui .
De José Fialho Gouveia Jr.
"Não acredito na vida depois da morte. Mas de cada vez que as bancadas da Luz se agitam e gritam "golo" gosto de pensar que, algures, o meu pai continua a levantar os braços, a sorrir e a abraçar quem ao lado dele estiver a assistir ao jogo.
Quantas e quantas vezes não nos vimos nos braços um do outro, empurrados pela cabeça do Rui Águas, pelo instinto do Magnusson, pela genialidade do João Viera Pinto, pela magia do Rui Costa, pela subtileza do Nuno Gomes e por tantos predicados de tantos e tantos outros. E também quantas e quantas vezes não voltámos para casa cabisbaixos, muitas vezes em silêncio, numa cumplicidade encarnada, depois de um ou outro deslize.
O meu pai morreu há cerca de cinco anos, a 2 de Outubro de 2004. Chorei. Muito. Nessa manhã. Ao longo do dia. No velório. à noite na cama. Em muitos dos dias que se seguiram. Mas - esta é a mais pura das verdades - houve um momento em que as lágrimas correram mais densas do que nunca. Mais carregadas de saudade. Aconteceu quando o carro funerário, que transportava o corpo em direcção ao Cemitério dos Olivais, passou em frente à nossa Luz. Pode parecer incompreensível e irracional, mas a noção de que não mais voltaria àquele estádio com o meu pai e a consciência de que nunca mais poderia festejar com ele uma vitória apertou-me demasiado o coração. Foi nesse instante que verdadeiramente se abateu sobre mim a noção de perda.
Meses depois, no final dessa época, seríamos campeões. Estava no Estádio da Luz quando o Luisão empurrou a bola para o fundo da baliza do Sporting e nos colocou muito perto do título. Sentada ao meu lado estava a minha mãe e atrás de mim um amigo que me abraçou e me disse em êxtase: "este é para o teu pai! Este é para o teu pai!" Senti nos lábios o toque de uma lágrima. Tinha um travo a alegria e a saudade ao mesmo tempo. Imaginei o abraço do meu pai. Vi o seu sorriso. Senti a sua felicidade.
Quando, por fim, festejámos o título, na última jornada, eu estava no Funchal. Fui ver o jogo sozinho a um bar na Marginal. Ao soar do último apito as ruas encheram-se de uma euforia vermelha. Por impulso, pedi duas cervejas e dirigi-me para a praia. Brindei em pensamento com ele. Voltei a abraçá-lo e festejámos juntos. Ainda tenho uma pequena pedra vermelha que descobri na areia e que trouxe como recordação dessa noite. Mais uma vez senti nos lábios um misto de alegria e de saudade.
Quem o conheceu sabe o tamanho que o coração do meu pai tinha. A ternura dos seus gestos. A bondade dos seus actos. Sofria a bom sofrer com o Benfica, desesperava com as bolas no poste , rejubilava com as vitórias, entristecia com as derrotas, mas sabia sempre reconhecer o mérito dos vencedores. Também no futebol, como em tudo na vida, foi um homem bom e apaixonado.
Devo-lhe esta deliciosa doença que é ser benfiquista, mas também lhe devo o desportivismo que julgo ter. E ao Benfica devo incontáveis momentos passados passados entre pai e filho. Obrigado Benfica. Obrigado, pai. E - julgo que citaste estes versos de Camões no discurso que fizeste na inauguração do novo estádio - " se lá no assento etéreo onde subiste, memória desta vida se consente", também sei que te recordas de mim em cada golo."
José Fialho Gouveia Jr - Jornalista
Impressionante e inquestionável! Vivó Glorioso SLbenfica.
ResponderEliminarLindo e arrepiante! O amor ao Benfica e do Benfica, de pai para filho e de filho para pai. ISTO é Benfica, sem dúvida!
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